O quão distante estamos de alcançar uma cidade equitativa para todos?
O Índice de Acesso à Cidade traz reflexões e encaminhamentos sobre 17 cidades brasileiras.
Resumo: O Índice de Acesso à Cidade (IAC) mede as condições de acesso às oportunidades por diversos modos de transporte em 17 cidades brasileiras e calcula o potencial dos aplicativos de transporte em contribuir para a melhoria deste cenário por meio da integração modal.
Ter acesso às oportunidades urbanas é a grande vantagem de morar em cidades que oferecem diversidade de equipamentos e serviços. Quando o acesso é impedido ou criam-se obstáculos por distâncias e preços, não se materializa esse potencial que as cidades têm para oferecer. Sendo assim, a falta de acesso à cidade representa uma barreira para melhorar as condições de vida urbana para grupos desfavorecidos e aumenta as desigualdades sociais.
As cidades brasileiras são extremamente desiguais, com muito mais dificuldade de acesso para grupos específicos. Os centros das cidades, que têm concentração de empregos formais, bem como de serviços e equipamentos públicos, tendem a concentrar a população mais rica e branca; já as periferias se caracterizam por precariedade e faltas, bem como por uma população majoritariamente negra. Atuar sobre as redes de mobilidade pode ter um efeito direto positivo sobre esses grupos, aumentando sua qualidade de vida. Dessa forma, é possível aumentar a capacidade de acesso a bens, serviços e oportunidades econômicas e proporcionar oportunidades de participação através do fornecimento de infraestrutura e serviços relacionados à mobilidade urbana.
Nesse contexto, uma rede de transporte multimodal é essencial para alcançar este objetivo. Enquanto o transporte coletivo segue como item central para o aumento de acesso por meio de viagens longas, outros modos, como a mobilidade ativa (andar a pé e bicicleta) e o transporte por aplicativo, também auxiliam no aumento deste acesso nas distâncias médias e curtas, incluindo primeira e última milhas no caso dos trajetos mais longos. As cidades são plurais, e uma mobilidade mais diversa é necessária para atender essa pluralidade de usos desejados e necessitados pelas pessoas no território urbano. Além disso, a possibilidade de utilizar mais de um modo de transporte em uma viagem é importante para que as pessoas possam escolher a combinação de maior conveniência ou desejo. Na prática, os automóveis de aplicativo podem auxiliar na complementaridade às redes de mobilidade já existentes.
Com isso em mente, no contexto do programa de formação Liderança & Transformação, em que a 99 e o CLP ofereceram um curso focado nas melhores práticas em gestão pública para mobilidade urbana para servidores de 17 municípios, a 99 e a Multiplicidade criaram o Índice de Acesso à Cidade (IAC). O índice criado, calculado por meio de dados da 99 e dados de fontes públicas para cada uma das cidades participantes do programa, consiste em uma ferramenta inovadora que visa auxiliar a tomada de decisão para políticas públicas em mobilidade urbana que foquem no incremento do acesso à cidade, por diferentes modos, e na redução das desigualdades urbanas socioespaciais.
Dessa forma, a metodologia utilizada buscou, primeiramente, medir as condições de acesso às oportunidades por diversos modos em 17 cidades brasileiras e, segundo, calcular o potencial dos aplicativos de transporte em contribuir para este cenário por meio da integração modal. De modo inovador, a metodologia também definiu maior peso para as condições de acesso da população negra, com o objetivo de contabilizar a meta de redução de desigualdades urbanas – isso evita distorções de dados que ocorrem quando se considera as médias em cidades com muitas desigualdades. Dessa forma, o indicador foi dividido em duas parcelas:
- Índice de Acesso às Oportunidades em Prol da Redução de Desigualdades (IAOD): com peso de 80%, é um indicador robusto e a base do índice, servindo para calcular o nível de acesso às oportunidades de emprego, saúde e educação em até 30 minutos (a pé, de bicicleta ou por aplicativo com viagens de até R$ 10) e em até 1 hora (por transporte coletivo). Nesta parcela foram atribuídos pesos maiores às regiões com maior população negra.
- Índice de Integração com Transporte Público (IATP): com peso 20%, esse indicador mostra como o transporte por aplicativo pode incrementar o acesso por meio da integração modal, baseado em dados de usuários da 99.
Observando os principais resultados, aparecem com destaque positivo no IAC as cidades de Natal e Curitiba, que são as duas únicas a oferecer mais de 50% (ou seja, estão ao menos na metade do caminho) das condições de mobilidade para a população acessar oportunidades de emprego formal, saúde e educação. Santo André (44,1%), Fortaleza (42,3%) e São Paulo (40,9%) são as cidades que completam a lista dos cinco melhores municípios dentre as cidades avaliadas. Dessa forma, de modo geral, o índice mostra quão distante ainda estão nossas cidades de garantir maior acesso de todos às oportunidades urbanas. Os resultados completos podem ser vistos na íntegra do relatório que se encontra disponível logo abaixo.
Apesar da situação longe da ideal nas cidades analisadas, é importante ressaltar que o IAC não tem como objetivo criar uma competição entre os municípios, já que cada cidade vivencia diferentes condições históricas, de oportunidades, uso do solo, desigualdades e sistemas de transporte. O índice apresentado mede o quanto a situação atual está distante do potencial do que as cidades podem oferecer (condição ideal) caso busquem melhorias em seus sistemas de mobilidade para cada região. A proposta é que os resultados permitam à gestão municipal diagnosticar seus pontos fortes e fracos e planejar estratégias para melhoria da qualidade da mobilidade urbana com enfoque na redução das desigualdades e, consequentemente, melhoria dos índices e da qualidade de vida da população.
O caminho rumo a cidades brasileiras mais inclusivas, democráticas e sustentáveis pode ser longo e tortuoso. Entretanto, 99, Multiplicidade e CLP acreditam que, por meio do uso de dados e evidências para tomadas de decisão, é possível ampliar o conhecimento sobre esse desafio e gerar maior capacidade de atuação na gestão pública na busca de uma cidade mais acessível e justa para todos e todas.
Baixe o relatório completo do Índice de Acesso à Cidade aqui:
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